quarta-feira, 6 de março de 2019

Cinzas

A quarta-feira de cinzas, no repertório católico, tradicionalmente é o dia dedicado ao arrependimento perante Deus. É um símbolo para que o cristão se lembre da fragilidade da própria vida e reflita sobre mudanças que deve fazer. Trata-se de uma tomada de consciência para que recomece uma nova forma de ser e de viver. No cenário político estamos precisando de uma fase como a quarta-feira de cinzas, para que o país mude sua forma de governança, de cuidar da coisa pública, dos seus cidadãos e de sua credibilidade internacional.

Assistimos a uma avalanche enorme de corrupção grassar em todo os níveis de poder, principalmente nas empresas sob o controle do governo. Cargos importantes se convertem, por causa do volume de recursos que controlam, em moeda de troca com grupos políticos, inclusive com alguns que deveriam fazer oposição. Este sistema antigo, muito embora absurdamente atual, em que se vive o legítimo estado de direito, deveria estar vivendo uma fase como a da quarta-feira de cinzas, em que mudasse para uma nova forma.

Ainda há uma velha democracia, construída pelos donos dos cargos públicos e uma nova democracia a ser construída por aqueles que deveriam ser os reais representantes do povo. Aqueles “donos” movimentam fortunas, manipulam pessoas e interesses, a serviço de ideologias ultrapassadas, do poder e do dinheiro. Estão com seus dias contados, em plena fase de cinzas, desde que o cidadão se imponha aos velhos métodos. Quando é que o cidadão vai acordar para mudar esta velha democracia, perversa e contraditória, em que caciques do poder econômico dominam os destinos de milhões, pousando como heróis em seus carros de luxo, com contas bancárias repletas de dólares no exterior? Será preciso mudar a mentalidade reinante do ganho fácil, da vantagem imediata, do carnaval sem limites e da quarta-feira de cinzas que não chega. O problema está na filosofia pregada nas escolas e nos lares: o imediatismo de uma consciência que não amadureceu para o exercício da cidadania.

terça-feira, 5 de março de 2019

Carnaval

O carnaval é uma grande festa popular. Atrai muita gente, movimenta a economia e dinamiza a indústria turística e hoteleira da cidade. As ruas ficam mais coloridas. parecendo grandes passarelas onde transitam atrações diversas que animam aqueles que se colocam como expectadores. Blocos, trios e demais grupos organizados de foliões e animadores se espremem nas ruas para atender aos apelos dos sentidos.

As manifestações que são vistas no carnaval apresentam uma grande diversidade de tipos humanos, com características que nem sempre são convencionais ou que estejam dentro da conformidade social comum. O que se encontrava reprimido, enclausurado pelas convenções e limites socialmente definidos, ali consegue um grande campo de representação e de expressão livre. O resultado é um mosaico de beleza singular e de estética agradável.

Não é raro encontrar-se indivíduos que, destoando do senso comum, dispam-se de suas indumentárias cotidianas e se apresentem com características bizarras, esquisitas e, às vezes, exuberantemente vestidos, num espetáculo multicolorido e grandioso.

Também é uma festa em que a livre manifestação é regra e em que o público de fato se torna propriedade de todos. Misturam-se pobres e ricos, nativos e estrangeiros, em uma multiculturalidade que irmana e iguala todos os seres humanos. É neste contexto que se percebe o avanço da percepção de que o gênero não define a pessoa, nem muito menos qualquer outro adereço exterior.

Mesmo assim, pelos excessos e por algumas manifestações que extrapolam o controle da consciência, trazendo prejuízos e danos psíquicos diversos, o indivíduo deve ficar atento ao seu anseio de se libertar das contingências sociais, éticas e orgânicas evitando a exacerbação desenfreada dos próprios sentidos. Paramuitos parece que vale tudo, sem qualquer censura nem respeito ao outro. Também é importante considerar que, à semelhança do circo romano, que entretinha o povo enquanto o governo espoliava com impostos, o carnaval, ainda que sem a direta manipulação dos governantes, mas operado pelo autoengano da explosão momentânea de alegria, muitas vezes incontrolável, trata-se de algo que necessita ser melhor vivido.

Bonito, exagerado ou não, trata-se de manifestação popular legítima que atesta o grau de repressão em que se encontra o ser humano. As opções convencionais de manifestação disponíveis ao ser humano na vida comum não têm sido suficientes para representarem a riqueza que se encontra em seu mundo interior. Tampouco a moral social e os costumes ditados pelos cânones religiosos têm sido respeitados ou estabelecido limites para que a natureza humana se revele com toda a sua riqueza, beleza e diversidade. A realeza da alma está em ser natural, divina e simultaneamente humana em qualquer lugar.