segunda-feira, 24 de fevereiro de 2020

Um bom governo

Um bom governo não necessita de propaganda, mas de disponibilizar informações para um melhor uso dos serviços públicos ofertados ao cidadão. Quando um governo se ufaniza pelos feitos que são obrigatórios, esconde suas deficiências, tentando engabelar a sociedade. Governos, mesmo que eleitos pelo voto democrático, podem se tornar prejudiciais quando priorizam investimentos na realização de serviços de grande visibilidade, ou quando atuam partidariamente, em detrimento do que é básico e essencial.
São como um bando de aves de rapina que, pairando acima do cidadão comum, vivem de suas carências e se locupletam evidenciando seus despojos, lamentando suas mortes. Remam contra o progresso quando os créditos não lhes são atribuídos, portanto, boicotam a criação de serviços que seriam inaugurados pelo governo seguinte. Não aceitam que a sociedade progrida se os louros forem atribuídos a quem não lhes comungue com a filiação partidária. Estes, que assim procedem, fazem parte do jogo do poder em que todos perdem. Justificam-se afirmando que estas são as regras e que todos assim agem. Porém, esquecem de que igualar-se em vilania é perpetuá-la.
Sim, um bom governo deve ter um bom programa, tornado público desde sua candidatura, onde constem os investimentos, e respectivas fontes de captação, que atinjam os setores da Educação, da Empregabilidade, da Saúde, da Segurança Pública, do Comércio, da Cidadania, dos Transportes, dos Direitos Humanos, do Lazer e da Espiritualidade. Porém, que não se situem apenas no curto espaço de tempo de um mandato, portanto, que alcancem o longo prazo por se tornarem políticas de Estado.
O que vemos, no período eleitoral e que se consolida no exercício dos mandatos, é uma disputa acirrada pelo lugar de salvador da pátria e pela ostentação do título de benfeitor público. Estes que assim atuam, assemelham-se aos césares dos circos romanos que, tripudiando sobre a vida humana, ofereciam-na em sacrifício para uma plateia patética e ignara. Anunciam obras públicas contaminadas previamente pela corrupção, em certames com cartas marcadas e vencedores acostumados a bajular os que possuem as chaves dos cofres do Estado. Os bajuladores se esquecem de que também prejudicam a sociedade, mesmo que justifiquem com grande oferta de empregos que viabilizam.
Um bom governo é aquele em que o cidadão é respeitado em sua diversidade, em seus direitos e em sua dignidade; é aquele que não privilegia setores da sociedade, nem governa para uns ou outros que deram mais votos, porque projetam seus horizontes sem a preocupação de se reelegerem.
Toda sociedade, mesmo quando nela possam ser encontradas pessoas que atuam contra sua estabilidade, merece um bom governo, pois excluir ou privilegiar grupos é demonstrar incompetência administrativa. Nem todo o povo tem o governo que merece, mas todo governo é o que dele não faz.

segunda-feira, 17 de fevereiro de 2020

O circo romano

É natural gostar de festas. Em geral, trazem alegria e renovação. Dissipam tensões e promovem a fraternidade entre as pessoas. Quando o hábito se transforma em vício, ou como única alternativa para que se alcance a felicidade, torna-se perigosa fuga da realidade. Cabe o discernimento aos que promovem, visto que também se comprometem com o modo estimulador das fragilidades humanas. Transformar a cidade de Salvador em constante palco de festas consideradas populares, sob o pretexto de incentivar o turismo é esquecer que existem necessidades básicas a serem satisfeitas antes de intoxicar o povo do entorpecimento fugaz. A cidade vive problemas sérios, sobretudo nas áreas da educação infantil e da saúde pública, esquecidas pelo poder público. É hora de pensarmos seriamente sobre o futuro, sem brincarmos de governar.
Assim agiam os imperadores romanos, que ofereciam ao povo o divertimento nas arenas para distrair o cidadão de seus graves problemas, enquanto eles e seus apaniguados se locupletavam. Do mesmo modo agiam os nobres franceses, enquanto o povo morria de fome eles se banqueteavam largamente. O carnaval de Salvador tem sua tradição, porém se transformou em sua festa máxima, sem limites, invadindo os dias úteis, reduzindo a normal produtividade da cidade. Para alguns foliões e outros que gostam de feriados, é um bom período para diversão e para descanso, mas para a maioria torna-se um transtorno de sua mobilidade e de sua vida normal.
Transformar Salvador em vitrine para dissipações momentâneas pode comprometer seu desenvolvimento. As escolas não funcionam, a segurança pública é exclusiva para os locais da festa, o comércio é restrito ao consumível pelo folião e quem mora naqueles locais tem sua vida interrompida. Ninguém consegue marcar consultas para cuidar da saúde naquele período, pois tudo funciona em torno do carnaval. Parece haver um grupo que lucra muito com o carnaval e certamente tem seus argumentos favoráveis quanto a indústria do turismo e aos recursos que trazem para os cofres da Prefeitura, porém defendem seus próprios interesses.
O cidadão sensato, que prefere a tranquilidade de sua cidade, foge dela, entregando-a aos excessos de quem aqui não vive e não tem compromisso com a cidade, deixando-a depredada, cuja limpeza e retorno ao natural custa caro aos cofres públicos, que de fato pertencem ao cidadão. Governar Salvador é uma delegação outorgada democraticamente, mas não é um cheque em branco. Parece que alguém quer ser o dono da cidade, pois se comporta como se não existissem graves problemas a serem resolvidos. Quem sofre é o povo, que, no período das festas, tenta ganhar alguma migalha na economia informal.  Particularmente, considero uma festa bonita e de legítima manifestação dos anseios e das repressões do ser humano, porém há que analisar os excessos estimulados pelo poder público.

segunda-feira, 10 de fevereiro de 2020

Dia do Trabalho

De fato, há muito que reclamar. Desemprego, salários baixos, condições precárias de trabalho, plano de saúde com baixa cobertura, falta de perspectivas de ascensão funcional, falta de estabilidade no emprego, estes são alguns dos problemas enfrentados pelo trabalhador. Para quem reclamar? Do governo, do patrão, do sistema, do pai, da mãe, do azar, de Deus, de outra pessoa, da mídia, da ansiedade, de problemas particulares? Portanto, também são muitos os prováveis responsáveis diretos e indiretos pelo que passa o trabalhador. Talvez cada um dos relacionados possa ter sua cota de responsabilidade. Creio que o despreparo dos governantes, em todas as esferas administrativas, seja o mais citado. No entanto, há também causas na própria filosofia de vida de nossa sociedade. A espera de soluções externas para solução dos problemas pode ser uma delas.
Podemos apresentar muitas soluções para o problema, variáveis de acordo com seu principal responsável, porém melhor seria não depender de nenhum fator externo para alcançá-las. A espera determina um modo inercial perigoso, pois acomoda, gera dependência e dificulta qualificações úteis ao trabalhador. Qualificar-se é regra básica de quem quer um bom e estável emprego.
Admitamos que seja possível eliminar as causas, tendo o cidadão recebido o melhor desde sua infância, portanto, bons pais, boa educação, sem traumas e merecedor de um bom sistema social, porém, ainda assim talvez não consiga emprego ou trabalhe insatisfeito sem se realizar profissionalmente. Onde estaria então a causa para solução definitiva do problema senão na subjetividade da pessoa humana? O trabalho dignifica o ser humano, oportunizando a realização pessoal pelos meios de acesso que proporciona ao que pode ser alcançado pela capacidade de cada um. Quando o ser humano tiver acesso a uma boa educação bem como a viver em um sistema que priorize a dignidade e a qualidade de vida certamente haverá realização pessoal.
Um outro fator para que o ser humano alcance um bom trabalho e atinja sua realização pessoal é não transferir para nada nem para ninguém seu próprio esforço de superação das adversidades, capacitando-se mesmo que não lhe sejam dadas as condições para tal. Seu desafio sempre será vencer suas próprias limitações, sejam impostas ou sejam endógenas. A quem reclamar? Melhor atuar em duas frentes, reclamando ao sistema imposto e a si mesmo.
Reclamar de si mesmo é imperativo para quem deseja vencer, independentemente das exigências do cumprimento de obrigações aos principais responsáveis pela solução dos problemas humanos. Exija-se mais do que ao sistema, pois é o próprio indivíduo que muda a realidade a sua volta. Adotar uma filosofia de vida empreendedora, aliada a uma boa educação doméstica são alternativas imprescindíveis para a autonomia e independência da pessoa humana.

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2020

Saúde Mental

O ser humano compreende a confluência de fatores biológicos, psicológicos, sociais e espirituais, de cujo conjunto emerge sua individualidade. A conjunção destes campos constitui o grande complexo por onde transita o que se conhece com o nome de eu ou de pessoa humana.
No entanto, o ser humano ainda está muito longe do alcance do equilíbrio necessário para a conquista de uma vida plena e feliz. Para tanto, é desejável um corpo bem cuidado, uma psiquê em harmonia, uma vida social bem articulada e uma espiritualidade profunda e realizadora.
No biológico, valoriza-se mais a estética do que a saúde, preferindo-se ter a pele esticada do que a compreensão da importante função do envelhecimento; despreza-se uma melhor qualidade de vida agredindo-se o corpo com hábitos estressantes; frequentam-se academias geralmente para gastar os excessos na alimentação; o ser humano é mais hedonista do que altruísta.
No psicológico, desconhecendo o funcionamento da própria mente, o ser humano opta por agir instintivamente; critica mais o outro do que lhe compreende o comportamento; julga-se moralmente as pessoas sem a necessária autoanálise; despreza-se o sentir valorizando-se mais a excessiva racionalidade; cuida-se mais da imagem em detrimento da valorização da essência; preocupa-se mais com o que os outros pensam, denunciando real insegurança, do que a apresentação ao mundo com transparência e autenticidade; ambicionam-se coisas e poder sem pensar em autorrealização.
No social, ostenta-se mais do que se busca o aperfeiçoamento de habilidades; cuida-se mais do pessoal do que se preserva o coletivo; o ter ainda prepondera sobre o ser; retira-se mais da sociedade do que se devolve como valores éticos; a maioria quer ser servida mais do que servir; valoriza-se mais o privado desprezando-se a coisa pública; o egoísmo predomina sobre a construção de uma sociedade mais justa, igualitária e harmônica.
No espiritual, vive-se uma religiosidade superficial sem a devida compreensão da transcendência do Espírito; adora-se um Deus para dele obter favores e benesses; aceitam-se dogmas sem a necessária preocupação com a instalação do perigoso fundamentalismo religioso; discriminam-se os que não comungam com suas crenças; por fim, ainda se pratica a religião para o atendimento a emergências psicológicas mal resolvidas.
Por estes motivos, o ser humano está muito longe da plenitude que almeja, necessitando observar que os métodos então utilizados de exaltação ao corpo, de manutenção da consciência tranquila, de uma vivência social egocêntrica e de uma incipiente espiritualidade que não resiste à compreensão precisa do significado da vida e da morte, estão falidos. Precisamos de uma nova ordem baseada na busca real pelo sentido e significado da vida, cujos fundamentos devem ser ensinados desde a educação infantil, em casa e na escola.