O mundo se surpreendeu com o anúncio de viva voz do ministério papal do Cardeal Ratzinger. Pode parecer estranho, pela surpresa, mas tem seu significado na história das religiões. Algo está mudando na psiquê religiosa coletiva que pode ser percebido pelo ato de Bento XVI. A fé, agora, não mais pode dissociar o humano do espiritual. A conhecida e antiga crise na cúpula da Igreja, não precisa mais ser desmentida, pois se trata do símbolo de uma mudança de paradigma psíquico. A mente humana não comporta mais a sacralização inconsciente do espiritual. A ascensão do pentecostalismo foi um aviso, o surgimento do iluminismo foi um grande alerta e, na atualidade, o alto índice de escolaridade e de uso de recursos tecnológicos são indícios de que o ego amadureceu na direção contrária à fé cega.
Muito mais do que um problema da Igreja Católica Romana, a renúncia do Papa é um aviso ao mundo sobre os problemas provocados pela forma como lidamos com o sagrado. A contraposição na qual se elegeram certos comportamentos humanos como profanos e outros como sagrados, é responsável por grande parte dos problemas ligados à fé. A eleição, com seus critérios tomados inconscientemente, se origina da antiga antinomia entre o instinto e a espiritualidade. Tudo que pertencia ao instinto, portanto ao que é do corpo humano, foi considerado profano, pecaminoso e contrário ao espiritual.
Porém, o que era considerado sagrado seguia a nominação dada por indivíduos que, por razões psicológicas que denunciavam possíveis instabilidades internas, dificultavam sua verdadeira compreensão. A corajosa e difícil decisão de renunciar simboliza o início da mudança de paradigma da arcaica irracionalidade do espiritual, para a utilização da razão aliada a fé. No paradigma antigo, há o predomínio da negação da vida material com correspondente supervalorização da vida espiritual. Em adição a isso, vê-se uma inferiorização do egohumano em relação a uma certa essência espiritual mais importante e verdadeira. O descuido à vida humana, empobrece a esperada vida espiritual.
Por fim, com a renúncia, nada vai mudar na Cúria Romana, pois a real transformação está ocorrendo na psiquê humana, que, de forma inconsciente, passa a considerar o humano como o meio par que s alcance o espiritual, isto é, não adianta se espiritualizar sem antes se humanizar.
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